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Ebook: A experiência do tempo: conceitos e narrativas na formação nacional brasileira (1813-1845)

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15.02.2024
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Ao que eu saiba esta foi a primeira tese em histó­­­ria, defendida no Brasil, em que se usou a “história dos conceitos” (Begriffsgeschichte) de Reinhart Koselleck como instrumento explicativo. Nas poucas linhas que se seguem, não se poderia ter a pretensão de mostrar como o autor o faz, em sua integralidade. Digamos ape­nas que uma parte relevante sua considera a mu­dan­ça nas considerações políticas de José Bonifácio, desde que é nomeado conselheiro de D. João VI, em 1820, até seu ostracismo, no início mesmo do pri­meiro reinado.

A razão deste destaque é dupla: (a) parece-me extremamente convincente a demonstração de como aquela mudança se associa ao uso de dois conceitos, o de história cíclica e o de progresso; (b) apesar da importância de Bonifácio na configuração política do Brasil, às vésperas de sua independência e em seu início, sua figura não conheceu até hoje a indagação a que faz jus. Pouco antes da independência, a posição de Bonifácio se singularizava por já não confundir o Império Português com o reino de Por­tu­gal.

O pacto então estabelecido supunha a efetiva unidade dos reinos de Portugal e do Brasil. Para que essa unidade se concretizasse, escapando a ex-colônia lusa da fragmentação que sucedera com a antiga Amé­rica hispânica, era preciso que, nas palavras de Valdei Lopes de Araújo, Portugal se “desvencilhasse dos en­tra­ves e desgates de seu passado”. Como bem observa o autor, essa possibilidade implicava “uma compreen­são, em grande medida, cíclica e fechada”, que iden­tificava Portugal com o fora de uso e o Brasil como um novo começo.

A proposta de Bonifácio tinha con­tudo contra si a política das Cortes de Lis­boa. Apesar do evidente conflito, Bonifácio con­tinua a defender a unidade entre Brasil e Portugal. Dentro ainda de uma concepção cíclica de história, a posição das Cor­tes era interpretada como retrógrada, pois “absolutista e recolonizadora”, ao passo que Bonifácio justifi­cava a sua própria posição alegando que o Brasil era a única possibilidade oferecida a Portugal de sair de seu círculo rançoso; o Brasil então se lhe apresentava como a condição de progresso da antiga metrópole.

Ou seja, em termos da história dos conceitos, o conceito de história era empregado por Bonifácio como maneira de justificar tanto a autonomia de sua pátria, quanto de mantê-la unida à nação lusa. É portanto menos por desejo próprio do que por efeito da reação das Cortes que Bonifácio afinal se inclina pela separação absoluta da antiga metrópole. Não se pense contudo que o des­taque de Bonifácio se dá apenas nas escaramuças que precedem a decisão do príncipe regente em tornar-se monarca de uma nação nova.

Tão importante quanto esse destaque é a sua defesa, em “A Representação dos escravos” da interrupção do tráfego negreiro, assim como a defesa da mistura das raças enquanto formadora de uma população brasileira, que, a largo prazo, seria homogênea. Noutras palavras, no início mesmo do Brasil independente, Bonifácio se contrapunha ao que será o mais infeliz clichê do país, entre as últimas décadas do século XIX e as primeiras do século XX: a afirmação, que se tornará capital n’Os Sertões de Eucli­des, de que a desgraça nacional tinha por raiz o cruza­mento das raças que o haviam constituído.

Pelas razões acima apresentadas, preferi ressaltar do li­vro apenas o que constitui uma sua parte. Esteja con­tu­­do o leitor certo que sua continuação mostra o mes­mo brilho e vigor.

— Luiz Costa Lima
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