Nesses Apontamentos realizados nos anos 1940, Bakhtin lança as firmes bases contra a representação, contra o projeto de criação de uma imagem do ser humano fechada, concluída, encerrada pelo autor - ou por si próprio - em um reflexo acabado da realidade. Bakhtin coloca em evidência que não só na linguagem cognitiva, que procede por conceitos, por abstrações, e não só na linguagem ideologicamente interessada ao domínio, à exclusão, à depreciação, há, na mesma inevitável tendência a reduzir o objeto, a perda da singularidade, da irrepetibilidade, da insubstituibilidade. Isso acontece também na linguagem artística, na arte verbal, na escritura literária. A imagem literária força o personagem de que fala a coincidir, de uma vez por todas, consigo mesmo, a ser definido, determinado, classificado, identificado”, diz a respeito Augusto Ponzio. Assim como Magritte, em sua vasta obra, por nós homenageado em releitura na capa, a imagem artística não deve devolver a face idêntica ao contemplador, sob o preço de ser tão-somente uma mentira, uma farsa, ou uma violência. A imagem artística, para assim o ser, deve ser aberta, inconclusa, até o ponto da impossibilidade do fechamento, como Magritte refere-se ao Arthur Gordon Pym, de Poe: a inconclusibilidade é a abertura própria do humano, presente na arte. Essa tradução comemora os 100 anos do primeiro artigo publicado por Bakhtin, Arte e responsabilidade, no almanaque Dia da arte, na Rússia, em 1919.
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